30.12.19

Urgência


Só tenho urgência
De calma; nisto cismo.
Não tenho paciência
Para imediatismo.

4.9.19

Burnout


Cadê o refrão grudado em ti?
Cadê o verso que te animava?
O sorriso que nunca mais vi?
Cadê a alma que te habitava?

26.8.19

Final de agosto


Já é final
De agosto
Outra vez.
Trezentos
E sessenta
E cinco
Dias
Sobrevividos
No peito
E no rosto
Um
De cada
Vez.
O pulso pulsa
A vida vibra
Transborda
Mais um mês.
De amarelo
Setembro
Bate à porta
Outra vez.

21.8.19

Prescrição contra a dor


Auscultando meu peito
Disse-me o doutor:
- Este ritmo é suspeito
  Por acaso sentes dor?

Plugou-me a monitores
Multiparamétricos
E chamou outros doutores
Com semblantes tétricos

Nada em mim estava ileso
As redondilhas, de doer!
- Carregas muito peso?
Doutor Quintana quis saber

O duro diagnóstico dado
Revelou várias aliterações
Vinte versos quebrados
E um desalinho de emoções

Tinha todos os tercetos
Completamente comprometidos
- Seja ao bloco removido!
Ordenou o doutor Azevedo

- Tratamento intensivo!
Decidiu o doutor Drummond
- E algum antidepressivo...
Doutor Leminski acrescentou.

Nos garranchos do doutor
A receita contra a dor:
Uma dose de poesia
Duas vezes ao dia.

26.7.19

Amor de vó


Amor de vó
É um negócio transcendente
Ungido de nescau gelado
E coroado com waffle quente

27.6.19

Não é euforia


Felicidade não é euforia
Pois esta é fugaz... varia!
Felicidade é permanência
De paz no coração
Certeza de sua existência
Até quando parece que não.

26.6.19

Amor paciente


Ante todo mal,
o amor é paciente.
Porém,
frequentemente,
terminal.

18.6.19

Letras apenas

Sois dores e pensamentos
De (in)certos momentos
Meríssimos arrazoados!
Pretensiosos poemas
A duras penas
Mal traçados.
Um amontoado
De letras.
Sois, pois, letras.
E letras apenas.

6.4.19

Teu silêncio tão meu


Escuta este silêncio
Tão nosso, privativo
Sintomático silêncio
Respirando no ouvido

Nosso não dito é mar
De afável correnteza
Navegamos na certeza
De sermos nós um par

Ruge ao pé do ouvido
E flui, sendo fruído
Um oceano particular

De todas as palavras
Que o discurso lavra
O silêncio ecoa amar

16.3.19

Herança poética


Seu Fernando foi Pessoa
E, tal Manuel, Bandeira
Da poesia que inda ecoa
N'alma luso-brasileira

Na Rua dos Cataventos
Um poeta contou cinco Anas
Quatro, porém, em pensamento
De Mário foi a Quint'Ana

Se o tocaio contava gente
Mário de Sá, Carneiro
Pronto para o sacrifício

Poesia que verte se sente!
Só sentimento é verdadeiro
Todo o resto é exercício.

15.3.19

Depressa


Andamos tão depressa
E distraidamente
Que perdemos na conversa
A sutileza presente.

14.3.19

Sem máscara


De idiotas somos um bando
Protagonizando idiotices
Diariamente fracassando
E disfarçando a toupeirice

Erramos mais que acertamos
Mas editamos a realidade
E o instagram nós estragamos
Com falsos filtros de vaidade

Mesmo não dando importância
Você, que me lê, se sabe também
Débil em alguma instância

Mas fingindo estar tudo bem
Acreditamos dominar a rota!
Ora! Quer coisa mais idiota?

10.2.19

Década aparte


¿Dónde estuvieran mis letras?
¿Y las cartas adonde fueron?
Engullidas como galletas
¿Pero quienes las comieron?

¿Dónde estuve yo
Por la década pasada?
Que acá - ¡mira! - no
He escrito nada

¿Dónde estuvieran mis letras?
Mis letras hartas
Eternas compañeras

¿Dónde estuviemos todos?
Tu y yo, amargos y rotos
Como mis cartas...

8.1.19

Modo avião


E ao final de mais um dia
Com um só risquinho de bateria
Sentindo-te da fruta o bagaço
Cancela aquela reunião
Entra no modo avião
E aterrissa no meu abraço